*Ao lado do nome, coloque também sua cidade!

Bento Gonçalves  

Bento Gonçalves da Silva

Na segunda metade do século XVIII (l752) recebiam um lote de terras mais ou menos na metade do caminho entre o arroio da Ponte e o rio Taquari, no local que ficou batizado por Piedade, "em o distrito da Freguesia do Triunfo" o poveiro Manoel Gonçalves Meirelles e sua mulher dona Antônia da Costa Barbosa, filha do povoador Jerônimo de Ornellas Menezes e Vasconcellos, nascida, ainda, em Guaratinguetá, São Paulo, enquanto êle era português, natural de Mondin de Bastos.

Havia já, na época, um pequeno povoado mais abaixo, no lugar reservado para "rocio" na margem do rio Taquari e sua foz com o Jacuí. Para êle se mudara Jerônimo de Ornellas ao ter desapropriadas as terras de sua "estança" do Pôrto de Viamão, também conhecido por Pôrto do Dornelles, contribuindo com muito de suas posses para a construção da Igreja do Senhor Bom Jesus.

O casal Manoel Gonçalves Meirelles-Antônia da Costa Barbosa teve diversos filhos e entre êstes dona Perpétua da Costa Meirelles, nascida no Triunfo, e que casaria com o Alferes Joaquim Gonçalves da Silva, português de Santa Marinha de Real, bispado de Lamego.

Foi dêsse casal que nasceu dona Perpétua da Costa Meirelles, que foi a mãe de Bento Gonçalves da Silva, conforme a certidão a seguir:

- "Aos dezenove dias do mês de outubro de mil setecentos e oitenta e oito, nesta Matriz do Senhor Bom Jesus do Triunfo, batizei e pus os Santos Óleos a - BENTO - filho legítimo do Alferes Joaquim Gonçalves da Silva, natural da freguesia de Santa Marinha de Real, bispado de Lamego, e de sua mulher Perpétua da Costa Meirelles, natural desta freguesia do Triunfo; neto, pela parte paterna, de Manoel Goncalves da Silva e de sua mulher Josefa Maria de Jjesus, ambos naturais da freguesia de Santa Marinha de Real, do mesmo bispado acima dito; e pela materna, de Manoel Gonçalves Meirelles, natural de Mondin de Bastos, arcebispado de Braga, e de sua mulher Antônia da Costa Barbosa, natural da vila de Guaratinguetá bispado de São Paulo; foram padrinhos o Tenente Manoel Carvalho de Souza, e Ana da Costa Meirelles, solteira. De que para constar, fiz êste assento que assinei. O Vigário Eusébio de Magalhães Rangel e Sã".

Bento Gonçalves da Silva, entretanto, nascera dias antes, o que o registro de batismo não menciona: 23 de setembro de 1788.

Segundo algumas tradições, seu destino era ser sacerdote. Contudo, foi ser militar, tendo sido sacerdote seu irmão Roberto que tomou parte ativa na Revolução Farroupilha.

Aos treze anos de idade já era Bento autêntico espadachim. Dizem que, agredido por um negro, ferrabrás temido na região, Bento Gonçalves com êle se bateu, matando-o num verdadeiro duelo a espada.

Iniciou sua carreira militar em 1811, na denominada Campanha de D. Diogo. Embora sem grande destaque, o furriel Bento Gonçalves, que sofreu diversas acusações, a pouco e pouco foi avante.

Terminada a campanha de 1811/1812, seguiu para Jaguarão, e no Departamento de Cêrro Largo, Estado Oriental, casou em 1814 com dona Caetana Garcia, filha de Narciso Garcia, natural de Espanha e de dona Maria Gonzales, natural de Povo Novo, adjaeências da cidade do Rio Grande.

Soldado por vocação, o Furriel de Dom Diogo, apesar dos boatos que espalharam de que desertara após o casamento, sempre estêve ativo e vigilante e tantos serviços prestou na fronteira de Jaguarão para onde se mudara, que em 1817 o Capitão General Marquês de Alegrete nomeou-o "Capitão de Guerrilhas", isto é: capitão de milícias.

Tomou parte efetiva e sempre eficiente nas campanhas platinas, destroçando o inimigo em Curales e Las Canas (l8l8), Cordovez e Carumbé (l8l9), Arroio Olimar (l820). Em 1824 era promovido a tenente coronel e nomeado Comandante do 39 Regimento de Milícias, que organizou. Com êste Regimento, a 12 de outubro de 1825, tomava parte no combate de Sarandi. Nesse mesmo dia fôra promovido a coronel.

Salientou-se sobremodo no combate do Passo do Rosário, a 20 de fevereiro de 1827. A "Musa Popular" consagrou-o nessa luta, dizendo: -'O herói Bento Gonçalves foi a nossa salvação"...

Em 1829 era promovido a coronel do Estado Maior e nomeado comandante do 4.1 Regimento de Cavalaria de l.a Linha, aquartelado em Jaguarão. A seguir foi comandante da Fronteira de Jaguarão, e da Guarda Nacional.

Liberal, prestigioso e prestigiado, - como todo homem de valor - era invejado e odiado pelos profissionais da calúnia. Entretanto, jamais procurou outra defesa que seus direitos e a verdade de sua vida pública, leal e sem segredos. Acusado de andar em conluios contra a unidade nacional, defendeu-o, sem que êle o pedisse, o velho amigo e companheiro Major João Manoel de Lima e Silva, irmão do Regente Francisco de Limae Silva, e tio do futuro Duque de Caxias.

Mas a mágoa imensa dos acontecimentos que o envolveram injustamente e, sobretudo, a pressão política que a administração exercia sôbre o Rio Grande do Sul e seus habitantes liberais, levaram-no ao extremo.

Eleito deputado à primeira legislatura da Assembléia Provincial criada pelo Ato Adicional de agôsto de 1834, aí desfeiteado pelo próprio presidente da Província que o acusou de querer separar o Rio Grande do Brasil e formar, mancomunado com Rivera e Lavalleja, um nôvo Estado, Bento Gonçalves, que já sabia da disposição dos próceres de seu Partido Liberal de se libertarem e libertarem o Rio Grande do Sul das garras da opressão que o dirigia, afastou-se e combinou a "arrancada" que a 20 de setembro de 1835 destruiria por completo as artimanhas políticas de Fernandes Braga e sua gente.

Nasceu, assim, a Revolução Reivindicadora de 20 de setembro que expulsou no Rio Grande do Sul o mandonismo e o autoritarismo que o infelicitavam.

O levante que se verificou ao mesmo tempo em todo o território gaúcho, liquidado o iníquo regime, resolveu solicitar ao Govêrno um novo presidente, capaz e digno. Parecia que a paz voltara. O govêrno nomeara um sul-rio-grandense e sábio que já se exercitara na diplomacia - Dr. José de Araújo Ribeiro. Entretanto, as coisas de tal forma se prepararam que o novo presidente nomeado não chegou a tomar posse como pretendia. Por isso, abespinhado, resolveu abandonar a Capital e, na cidade do Rio Grande, contrariando a lei, tomou posse clandestinamente perante a Câmara Municipal daquela cidade, sem dar maior importância à Assembléia Provincial. Entretanto, apesar disso, tanto a Assembléia, como Bento Gonçalves em pessoa, dirigiram-se ao Presidente Araújo Ribeiro, convidando-o a legalizar sua posse em Pôrto Alegre. Negou-se e, em resposta, mandou fôrças, que organizara, atacar Pôrto Alegre. Com êsse gesto, a luta se reiniciou, obrigando os liberais, (farroupilhas como os cognominavam), que haviam dispersado as tropas, a refazerem suas hostes e enfrentar a luta que o presidente nomeado lhes propunha. E a Revolução Farroupilha começou verdadeiramente.

Os liberais do Rio Grande do Sul, em grande parte, tinham tendências republicanas. Entretanto, não eram republicanos seus chefes ostensivos, mas apenas "liberais-extremados". A luta assim iniciada, e em virtude da necessidade absoluta de defesa, levou-os ao gesto extremo: proclamar a República.

Bento Gonçalves, não consultado - e que seria aprisionado logo após no famoso combate da ilha do Fanfa, a 4 de outubro, concordou, porém, plenamente, com a proclamação feita pelo General Antônio de Souza Neto nos Campos de Seival a 11 de setembro daquele ano de 1836: a República Federativa.

Proclamada a República, empossado o govêrno que escolhera para Capital a vila de Piratini, foi Bento Gonçalves eleito presidente da República Rio-Grandense. Mas, prêso, enviado logo depois para o Rio de Janeiro, nada podia fazer. Por isso, para substituí-lo fôra eleito José Gomes de Vasconcellos Jardim.

Do Rio de Janeiro foi Bento Gonçalves enviado para o presídio da ilha de Fernando de Noronha. Felizmente, um desarranjo no barco que o conduzia obrigou o comandante a ficar por alguns dias na cidade do Salvador, Bahia.

E, enquanto o navio estava no estaleiro, Bento Gonçalves fôra trancafiado no forte de São Marcelo e Nossa Senhora do Pópulo, em plena baía de Todos os Santos. Com incrível rapidez espalhou-se a notícia e a Maçonaria e amigos de Bento Gonçalves resolveram agir e acertar a fuga. E Bento Gonçalves fugiu, regressando, afinal, ao Rio Grande do Sul, assumindo, em 1837, o cargo para que fôra eleito.

Mas a campanha de desprestígio contra o grande chefe e condutor Bento Gonçalves, também se fêz sentir no seio dos próprios farroupilhas. Disso resultou seu pedido de demissão do cargo de presidente e de comandante em chefe das fôrças da República Rio-Grandense em luta contra o Império e, por fim, o famoso duelo com Onofre Pires da Silveira Canto, seu velho amigo e companheiro de lutas liberais.

Com a morte de Onofre, em conseqüência do ferimento sofrido no duelo, o general farroupilha apresentou-se à prisão ao seu substituto no comando em chefe das fôrças - o General David Canabarro, - também seu velho amigo. Êste, ao ouvir de Bento o relato do acontecido (que, aliás, já sabia), apenas disse: - O caso é grave. - E quando o general lhe quis entregar a espada, Canabarro recusou-se a recebê-la, declarando:

- Conserve-a, general. Para manter a espada de Bento Gonçalves somente conheço um homem: Bento Gonçalves da Silva.

Mas a revolução estava no fim. As densas nuvens que vinham do Prata com as provocações do ditador D. Juan Manoel de Rosas, obrigaram David Canabarro a sérias medidas. Dela., logo depois se aproveitou o nôvo comandante em chefe das fôrças imperiais e presidente da Província, General Conde de Caxias, e, graças à sua dinâmica e diplomática maneira de agir, farroupilhas e imperiais entraram em entendimento, fazendo-se a pacificação da Província com o Tratado de Poncho Verde, de 25 de fevereiro de 1845. A 28 .daquele mês e ano David Canabarro proclamava a pacificação, naqueles mesmos campos, enquanto Caxias, já marques, proclamava, pouco mais adiante, nas margens do rio Santa Maria, a volta do Rio Grande do Sul ao mundo brasileiro.

Bento Gonçalves, entretanto, estava doente. Não estêve presente aos solenes atos, onde seus inimigos figuravam continuando a caluniá-lo. Pobre, sem dinheiro algum, apenas com as terras que conservara em Camaquã, para lá voltou, contemplando a casa abandonada e os campos despovoados. Com empréstimos de amigos recomeçou a vida. Mas pouco duraria. Gravemente enfermo foi a Pedras Brancas (hoje município de Guaíba) em busca de seu velho amigo e companheiro José Gomes de Vasconcellos Jardim, que ali, além de médico-prático de grande fama e renome, possuía um hospital. Mas, nem sequer chegou a ser tratado devidamente, pois a pleurisia que se manifestara violenta, levou-o em seguida. Era o dia 18 de julho de 1847.

Seu corpo foi trasladado para Camaquã, em cujo cemitério ficou até o ano de 1909, quando o então Intendente do Rio Grande, Dr. Juvenal Miller, mandando erguer um monumento de granito e bronze, solicitou aos herdeiros autorização para transladar para o alicerce daquele monumento notável os restos mortais do glorioso gaúcho General Bento Gonçalves da Silva. E ali repousam, desde então, as cinzas do imortal farroupilha.


Origem: Material recolhido do livro Construtores do Rio Grande, autoria de Walter Spalding. Livraria Sulina Editora, 1969. Publicado em 29/05/2001.Re-editado por Roberto Cohen em 20/11/2003.